segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Rain Man e o caso Ronaldinho Gaúcho


Ronaldinho Gaúcho perdeu uma grande e certamente a última oportunidade de se reconciliar com a torcida do Grêmio. Depois dos fatos que marcaram sua saída para o Paris St Germain em 2001, grande parte da torcida tricolor tornou-se inimiga de Ronaldinho e de seu irmão Assis.

Eis que surgem as notícias sobre o possível retorno de Ronaldinho! A torcida se alvoroça! Muitos que até então eram contra seu retorno começam a aceitar esta possibilidade. Seria realmente fantástico! Imaginem, mesmo estando possivelmente fora de forma e desmotivado, sua vinda para o Grêmio seria como diz o ditado: "juntar a fome com a vontade de comer". As mágoas da torcida se dissipam. Retornando ao Grêmio, além da reconciliação com a torcida e com o time do coração, Ronaldinho estaria novamente motivado. Seleção brasileira, Libertadores, Brasileirão, Geral do Grêmio, um verdadeiro banquete! Por outro lado a torcida previa um ano cheio de possibilidades de conquistas, pois o time que terminou o ano de forma brilhante manteria praticamente o mesmo elenco e ainda teria o reforço do super-craque!

Tudo acertado, contrato redigido, brinde e festa anunciada! Uma história digna das telas dos cinemas: A vida de um menino pobre que, formado nas categorias de base do clube do coração, sai pelo mundo, adquire fama, fortuna e depois retorna para encerrar sua carreira conquistando títulos para o clube que o havia lançado. Que maravilha! Que sonho!

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Bom, o que aconteceu todos já sabem e quase ninguém consegue explicar.
Eu disse quase!
Recebi um e_mail de um amigo com este texto, escrito por um advogado que, infelizmente, não tem o nome divulgado, mas faz uma análise sobre o porquê do sonho frustrado. De tudo que escutei e li sobre este assunto nada foi tão brilhante.


As questões ligadas ao comportamento, e as emoções que o determinam, sempre me instigaram. A ausência de compromisso técnico ou profissional dá a liberdade para cometer desatinos de avaliação. Mas o momento requer que se faça.

Não posso deixar de concordar que sempre tive o Dentuço como autista. A extrema habilidade física, o domínio precário de um vocabulário de cinqüenta e poucas palavras, o olhar bovino com que contempla o mundo, o mesmo sorriso idiota quando faz um golaço ou erra um pênalti, são sintomas evidentes de que algo não vai bem naquela mente alheia ao mundo exterior. Assim, como os autistas, o Dentuço – fora o séquito de seguidores da sua fortuna - não tem amigos. Dos tantos colegas de profissão com que teve contato, não há notícia de um jogador que se refira a ele com carinho: a ausência de afeto é o traço marcante, e triste, desta síndrome.

A dupla Dentuço e Assis trazem à lembrança o excelente filme Rain Man, em que o vigarista interpretado por Tom Cruise, em meio a uma importação fraudulenta de carros esportivos italianos, se vê como tutor do seu irmão mais velho – Raimond – interpretado por Dustin Hofman. Ao perceber que o irmão autista havia decorado parte do catálogo telefônico no quarto do  hotel, decide explorar essa habilidade para apostas no Black-Jack.
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Ambos – Tom e Roberto – exploram as habilidades de seus irmãos. As inquietações de Rain Man foram atenuadas por exercícios mnemônicos; as do Dentuço são resolvidas com cerveja, pagode e mulheres de aluguel. O dinheiro fica para quem sabe guardá-lo.
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As semelhanças entre as mesas de Las Vegas e os gramados da Europa param por ai. A personagem de Tom Cruise era movida apenas por dinheiro. Assis, apesar de também vigarista, não tem o dinheiro como móvel do seu comportamento; senão o Dentuço já estaria empregado no Grêmio, ou no Palmeiras, ou no Flamengo, e duas torcidas estariam pesarosas pela incapacidade financeira do seus clubes, mas não indignadas.
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Ocorre que a alma de Assis é acometida de dois males, já bastante sérios quando se  apresentam de forma isolada, que ganham contornos inacreditáveis e imprevisíveis quando somados.
Assis é amoral! Diferente do imoral, que tem sua moralidade própria, o amoral não tem moral alguma. Não lhe faz a menor diferença o apreço que os outros tem por ele; tampouco lhe incomoda o desprezo que provoca no convívio com os humanos. Não se incomoda em sequer buscar justificativa para os seus atos, apenas os pratica, em nome de nada, ou pior, em nome da outra mazela que o aflige.
Assis é megalômano! Acredita – com a sinceridade que lhe falta em todas as outras instâncias da vida – que é maior e melhor em tudo o que tem e faz. Em parte tem razão: o Dentuço, quando joga, é único neste futebol de muita imposição e pouco talento. Por isso não tem o menor pudor em submeter homens sérios, negociadores competentes, empresários de sucesso, líderes de multidões, às suas artimanhas primárias.
A megalomania não o deixa entender em qual o contexto a destreza do seu tutelado está inserida. Por isso reduz  a números, em relação aos quais não tem convicção, eis que os números jamais darão a medida exata da grandeza que está em jogo. Dinheiro é energia, dizem os cabalistas, e não há mal em querer acumular energia, nem em estabelecer as regras para compartilhá-la.
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No futebol, bem antes do dinheiro, um pouco antes da paixão, estão em jogo as emoções. A beleza de uma jogada perfeita não está na plasticidade do lance, mas na emoção que desperta em quem joga e em quem assiste. Sem emoção, uma partida de futebol é menos que um jogo de videogame no modo “iniciante”. A emoção é a matriz da paixão dos torcedores; que direciona a energia coletiva no mesmo sentido. Quem associa emoção sua marca vende mais pelo maior preço. A Nike é o que é hoje graças à emoção de Mickel Jordan.
É exatamente ai que o Assis-Moreira Group se atrapalha: não sabem lidar com a emoção; talvez nem saibam o que emoção venha a ser.
Triste! Estão condenados a nunca ficarem satisfeitos, por maior que seja o contrato, a bebedeira, o pagode, o plantel de mundanas...

Que o vazio lhes seja leve!
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